PRÁTICA DE ENSINO DE FÍSICA MODERNA
Simultaneidade de eventos relativísticos
Como vimos no capítulo anterior Einstein precisou derivar a lei da composição das velocidades de Galileu adotanto o conceito newtoniano de tempo absoluto, ou seja, supondo que o tempo é o mesmo para todos os referenciais, para mostrar que não existe incompatibilidade entre a lei da propagação da luz e o princípio da Relatividade, seria preciso reformular o conceito de tempo o que gerou uma completa revolução das leis da mecânica. Para saber mais leia o texto a seguir: sobre o conceito de tempo na Física.
Sobre o conceito de tempo na Física
Texto retirado do livro de Albert Einstein.
Imagine que em dois lugares A e B, situados sobre o leito de uma estrada e muito distantes um do outro, caiu um raio sobre os trilhos. Acrescento a informação de que os dois raios ocorreram simultaneamente. Se agora eu lhe perguntar, prezado leitor, se está informação tem sentido, você me há de responder com um categórico “sim”. Mas, se eu insistir em que você me explique melhor o sentido da afirmação, depois de refletir um pouco você há de perceber que a resposta a esta pergunta não é tão simples como parece à primeira vista: “Em si, o significado da afirmação é claro e não necessita de outros esclarecimentos, mas eu teria que refletir um pouco se recebesse a tarefa de determinar, através de observações, se neste caso concreto os dois fenômenos foram simultâneos ou não”. Não posso me dar por satisfeito com esta resposta, pela seguinte razão. Admitindo que um hábil meteorologista, através de engenhosas considerações, tenha chegado à conclusão de que nos lugares A e B o raio tenha sempre que cair ao mesmo tempo, surge a tarefa de verificar se este resultado teórico corresponde ou não à realidade. A situação é análoga em todas as proposições físicas nas quais o conceito de “simultâneo” desempenha algum papel. Para o físico, o conceito só passa a existir quando há a possibilidade de verificar, no caso, concreto, se o conceito se aplica ou não. Existe pois, a necessidade de uma definição de simultaneidade tal que forneça o método por meio do qual, no caso com que nos ocupamos, se possa verificar por meio de experimentos se os dois raios caíram simultanemente ou não. Enquanto esta exigência não for cumprida, como físico (aliás como não físico também!) estou sendo vítima de uma ilusão se acredito poder ligar um sentido à afirmação da simultaneidade. (Se você não concordar com isso, prezado leitor, é preferivel que não continue a ler.)
Depois de algum tempo de reflexão, você me propõe o seguinte para constatar a simultaneidade. Vamos medir a reta AB ao longo da via férrea e colocar um observador no centro M dessa distância, provido de um dispositivo (por exemplo, dois espelhos com inclinação de 90º um em relação ao outro) que lhe permita uma visão óptica simultânea dos dois lugares. Se este observador perceber os dois raios ao mesmo tempo, eles são simultâneos.
Fico muito satisfeito com a resposta. Porém, não posso considerar o assunto como inteiramente esclarecido. Sinto-me impelido a fazer a seguinte objeção: “Sua definição seria perfeitamente correta se eu já soubesse que a luz (que permite ao observador em M a percepção dos raios) se move sobre a reta A➝M com a mesma velocidade que sobre a reta B➝M. Uma verificação desta hipótese só seria possível se já dispuséssemos dos meios para medir o tempo. Parece então que caímos em um círculo vicioso”.
Depois de refletir um pouco mais, com razão você me lançara um olhar de desprezo, explicando: “Mesmo assim, mantenho minha definição de há pouco, porque na verdade ela não faz nenhuma suposição sobre a luz. À definição da simultaneidade só se pode impor uma única condição, a saber, que em todos os casos reais ela me forneça um meio empírico para decidir se o conceito a ser definido é ou não aplicável. É indiscutível que minha definição cumpre esta condição. Afirmar que a luz emprega o mesmo tempo para percorrer os caminhos A➝M e B➝M não é, na verdade, nenhuma suposição ou hipótese sobre a natureza física da luz, mas sim uma estipulação que posso fazer livremente para chegar a uma definição da simultaneidade”.
É claro que esta definição pode ser empregada para dar um sentido exato à afirmação da simultaneidade não apenas de dois, mas de quantos eventos quisermos, quaisquer que sejam as posiçõrs relativas dos lugares em relção ao corpo de referência (em nosso caso, o leito da estrada). Assim, chegamos também a uma definição de “tempo” na física. Imaginemos com efeito, que coloquemos nos pontos A, B, C dos trilhos (que é aqui o sistema de coordenadas) relógios de igual construção e de tal modo acertados que as posições de seus ponteiros sejam simultaneamente (no sentido acima) as mesmas. Então entendemos por “tempo” de um evento a indicação (posição dos ponteiros) daqueles relógios que estão na vizinhança (espacial) imediata do evento. Desta maneira, a cada evento é atribuído um valor do tempo, que em pincípio pode ser observado.
Esta convenção ainda contém uma hipótese física, cuja validade dificilmente pode ser posta em dúvida, se não houver razões empíricas para isto. Com efeito, admite-se que se todos esses relógios forem construídos de forma idêntica eles terão o “mesmo ritmo”. Em termos mais precisos: se dois relógios em repouso forem colocados em diferentes lugares do corpo de referência - de modo que uma configuração dos ponteiros de um deles é simultânea (no sentido acima) com a mesma configuração dos ponteiros do outro -, então as próprias configurações dos ponteiros são simultâneas (no sentido da definição acima).